segunda-feira, 27 de junho de 2011

o novo woody allen


“Pena de quem viu Paris à Meia-noite no fds. melhor q ver um novo woody allen é a expectativa de vê-lo sabendo q está num cinema perto de vc.”
Escrevi isso no Twitter na segunda-feira subsequente à sexta em que Meia-noite em Paris, o novo Woody Allen, entrou em cartaz em Porto Alegre. Na quinta-feira, uma semana após a estreia, finalmente assisti ao filme. A semana entre a estreia e a ida ao cinema é como um ritual sabático, excitante, de espera e expectativa.

Woody Allen faz um filme por ano, uma frequência quase ritualística também (segundo a Wikipedia, a última vez que o judeu nova-iorquino lançou dois trabalhos no mesmo ano foi há quase duas décadas, em 1992, quando foram paridos Neblinas e Sombras e Maridos e Esposas, e o último ano que não viu nascer uma obra de Allen foi 1974). Seus fãs aguardam a novidade com avidez, cada qual com seu ritual, individual ou em pequenos grupos.

O meu é esse, simples: assistir ao filme uma semana depois de sua estreia. Sete dias é tempo suficiente para deixar brotar aquela vontade, aquela curiosidade, aquela saudável impaciência e um certo temor de que o título saia de cartaz prematuramente. Como, aliás, já aconteceu comigo: o gostinho da expectativa de assistir a O Sonho de Cassandra se tornou amargo quando fiquei a ver navios, traído pela inexplicável curtíssima temporada de exibição. Daí fixar em exatos sete dias o período preparatório. Não é cabala, é precaução.

Outro temor que me vejo obrigado a enfrentar é o de alguém deselegantemente contar o final do filme ou algum detalhe importante, estragar uma piada, desfazer uma surpresa. É um risco considerável. Se bem que relativo, porque ninguém consegue fazer uma história do Woody Allen parecer tão divertida e saborosa a não ser o próprio. Além do mais, todo fã do Woody tem certeza de que sabe como ninguém ver um filme dele, desvelar suas nuanças, captar uma referência, compreender uma metáfora sub-reptícia e sacar uma piada interna, daquelas que só sendo muito íntimo do autor - condição que o fã confere a si próprio, sem cerimônias.

Não confundir esse expediente deplorável dos estraga-prazeres com comentários e críticas despretensiosas sobre o filme. Por exemplo: como as que se lê e ouve pela imprensa ou as dos amigos e conhecidos, coitados que ignoram a semana sabática de saborosa privação (e provação). São geralmente opiniões pessoais do tipo “gostei/não gostei”, incapazes de minar nosso interesse pelo filme, tampouco de adiantar ou postergar a data em que vamos deliciarmo-nos com ele, mas que atiçam nosso desejo no período da espera.

A maioria das considerações, seja o “gostei” ou o “não gostei”, é sucedida por sentenças como “é o mesmo Woody Allen de sempre” ou “é divertido, mas nada de novo”. Típicos de espectador comum (sim, os fãs se colocam acima do que consideram espectador comum). São asserções de quem, quando do lançamento de Match Point, não titubeou em vaticinar: “é o melhor Woody Allen”, quando na verdade se trata do menos Woody Allen dos Woody Allens. Esses comentários são saudáveis para aumentar nossa expectativa, e para reafirmarmos a nós mesmos, após ver o filme, que eles não entenderam.

Eles não sabem, por exemplo, que um Woody Allen não se explica completamente por si só, mas compõe o conjunto da obra, faz muito mais sentido se relacionado aos demais trabalhos de sua filmografia. Nem imaginam que a suposta mesmice ou repetição faz parte de uma marca registrada do autor, que criou seu próprio jeito de escrever, filmar, dirigir, dando liga a essa teia de filmes. Ignoram que com essa aparente carência de profundidade na construção das personagens, repetições de situações e tramas, limitação de recursos estilísticos, preguiça e falta de audácia para desafiar a gramática fílmica tradicional, o cineasta destila sua agridoce e singular visão da condição humana.

Alguém pode dizer, para justificar o ato precipitado de assistir ao filme logo na estreia, que a espera já ocorre desde o seu lançamento internacional. Mas não, essa espera por algo distante, ainda inacessível, é infinitamente menor do que a espera quando o objeto de desejo está ali, disponível, a poucos metros, a poucos minutos de ti. Às vezes, quando um filme estreia no Brasil, Woody já tem mais um ou dois filmes sendo rodados ou já exibidos no exterior. Mas o que nos assanha mesmo é o que já chegou.

Sobre Meia-noite em Paris? É um Woody Allen. Que mais dizer? Esperemos o próximo, The Bob Decameron, no ano que vem.

3 comentários:

Ananda Hilgert disse...

Adorei o texto!! Ainda não vi o filme e to morrendo de vontade de assistir, como todo fã de Woody Allen.

Só discordo de uma parte do teu texto: o próprio Woody Allen disse que "Match Point" foi o melhor filme dele, inclusive o único que ele quis assistir mais de uma vez. ;-)

wagner disse...

Oi, Nanda. Obrigado pela visita, as portas estão sempre abertas pra ti, as virtuais e as reais.

Bem, o próprio Woody Allen disse que Manhattan é seu pior filme. Que fazer? (Ademais, eu não critiquei o Match Point, apenas disse que é um filme que agradou muito os que não curtem muito o Woody Allen). Beijo.

Anônimo disse...

que lindo fanatismo. li com prazer.